Entidades de estudantes se manifestam contra implantação da EaD durante a pandemia
Data: 14 de abril de 2020
Entendimento é de que o momento é inadequado e provocaria evasão diante dos problemas enfrentados por estudantes. Além disso, falta de diálogo e precipitação demonstram incapacidade de considerar as particularidades diversas das/os alunas/os
Representações estudantis do Ifes se posicionaram nos últimos dias contrariamente à implantação da Educação à Distância (EaD) durante a pandemia da COVID-19 (coronavírus). Dessa forma, o entendimento das/os estudantes sobre a precipitação do Instituto no tratamento da questão é semelhante ao posicionamento, já divulgado, do Sinasefe Seção Ifes. (clique aqui e confira o posicionamento do Sinasefe)
A diretora de Comunicação do Centro Acadêmico Livre de Letras “Elisa Lucinda”, do campus Vitória, Lorrana Bernardes Bastos, explicou que a decisão do Comitê de Crise do Ifes sobre a implantação da EaD aconteceu de cima pra baixo, sem o diálogo adequado, num momento de excepcionalidade, excluindo diversas entidades do movimento estudantil do processo.
“Houve um quase monólogo por parte do Ifes e isso se deu porque foram excluídas entidades estudantis, como nosso centro acadêmico e outros. Além disso, foi proposto que os alunos sem acesso básico recebessem equipamentos como computadores e internet, sem explicações sobre como isso será viabilizado, em especial para alunos que enfrentam situações diversas de vulnerabilidade social, que não seriam facilmente alcançados. Também não foram previstas ações para alunos com deficiência e outras necessidades educacionais especiais”, disse.
Articulações
As/Os estudantes estão articulando ações contra a decisão do Ifes e para isso realizam conversas com alunas/os, em especial as/os que têm diversas dificuldades para manterem o estudo em seu domicílio, assim como alunas/os com deficiências, alunas que são mães, e com as/os que têm problemas de conexão por má qualidade ou insuficiência do pacote de internet.
Com os secundaristas, as conversas começaram pelas/os estudantes do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Jovens e Adultos (Proeja), que também já divulgaram posicionamento contrário à decisão do Ifes (clique e leia a Nota de Repúdio das/os Alunas/os). Além disso, conversas foram estabelecidas com o Sinasefe Seção Ifes e com grêmios de outras instituições, inclusive da rede estadual, como o grêmio da Escola Estadual Maria Ortiz, em Vitória.
Lorrana lembrou, ainda, que grande parte dos docentes é contrária ao EaD como está sendo imposto e que os professores não podem ser colocados nessa situação de educador EaD sem que haja planejamento e qualificações que garantam a qualidade do ensino do Ifes.
“O abuso da EaD (que seria complementar) pode dificultar o diálogo entre aluno e professor, fortalecendo um modelo superado de educação em que professores são fornecedores de conteúdo. A presença de alunos junto ao professor é fundamental para reduzir a evasão, aumentar as chances de o aluno chegar ao final do curso, e de aprender determinados conteúdos mais complexos. É preciso contemplar as particularidades de cada aluno. No ambiente virtual a tendência é homogeneizar todo mundo. Essa é nossa preocupação e nosso cuidado”, explicou.
Dificuldades
Lorrana é estudante do curso de Letras do campus Vitória, trabalhou no Proeja e fez iniciação científica sobre o público atendido no Programa. A partir dessa experiência e pesquisa, ela elenca algumas das principais dificuldades comuns a estas/es alunas/os: são trabalhadoras/es que não possuem vínculo formal, autônomos que perderam grande parte da renda por conta da quarentena e estão ocupados em criar soluções para sobreviver; muitos vivem em regiões de vulnerabilidade social e, além da pandemia da Covid-19, precisam enfrentar outros problemas básicos como acesso à saneamento básico, por exemplo; há, ainda, alunos que integram a população de rua, com privação de insumos básicos e dificuldade de acesso à internet de qualidade; e alunos com deficiência ou outras necessidades especiais.
“Não somos avessos a toda e qualquer ferramenta EaD. Nosso currículo, inclusive, prevê que parte das atividades funcionem nessa modalidade, mas a proporção definida seria extrapolada pela proposta do Ifes. Nossa preocupação maior é com alunas/os que são da modalidade presencial e que já precisam fazer parte do curso por meio da EaD, mesmo sem terem acesso em casa. Até o início da quarentena, eles usavam os laboratórios da instituição. Como fica a situação dessas pessoas? Vai prejudicar a permanência na Instituição. Difícil falar disso nesse período em que estudantes estão passando por necessidades. É arbitrário”, ponderou.
Maquiagem de democracia
A pesquisa de opinião realizada pelo Ifes não ouviu nem 50% das/os estudantes. É o que argumenta Lorrana Bernardes Bastos. Para ela, a implantação de algo tão impactante não pode limitar o debate a esse recorte. Além disso, é preciso que as complexidades da modalidade sejam consideradas para além de se concordar ou não e de identificar se há acesso aos meios técnicos.
Somado a isso, grande parte das/os professoras/es relatou não ter experiência com a EaD e possuir ressalvas quanto à sua implementação. “Diante dessa amostragem e do posicionamento contrário de grande parte das/os professoras/es, concluímos que a pesquisa tentou forjar um diálogo democrático que não aconteceu. Foi uma maneira de maquiar de democrática a verticalização das decisões. A concepção e aplicação da pesquisa foram ineficientes”, concluiu.