Destruição do Museu Nacional reflete política de abandono da Educação, Pesquisa Científica e Cultura no Brasil
Data: 6 de setembro de 2018
A situação de restrição orçamentária pode ser constatada quando analisados os recursos disponibilizados para a manutenção do museu nos últimos anos
Foto: AFP/Mauro Pimentel
O Sinasefe Seção Ifes torna pública sua indignação com o incêndio ocorrido no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, no último domingo, 2 de setembro. As perdas são irreparáveis e as labaredas de fogo que consumiram quase todo o acervo de 20 milhões de peças e o palácio de valor histórico não são resultado de uma fatalidade, mas do desmonte das políticas públicas e dos investimentos no Brasil que atingem a Educação, a Pesquisa Científica e a Cultura no país.
O Museu Nacional foi criado por D. João VI, em 06 de junho de 1818 e, inicialmente, era sediado no Campo de Sant’Ana. O objetivo era atender aos interesses de promoção do progresso cultural e econômico do país. Antes do incêndio, já na atualidade, ele era um museu universitário e tinha perfil acadêmico, sendo a mais antiga instituição científica do país. As exposições eram resultado da sua história e das atividades de pesquisa e ensino, e cumpriam a finalidade de produção e disseminação do conhecimento nas áreas de Ciências Naturais e Antropologia.
A situação de restrição orçamentária da instituição pode ser constatada quando analisados os recursos disponibilizados para a manutenção do museu nos últimos anos. Dos R$ 520 mil anuais previstos para a manutenção do Museu, houve redução para R$ 340 mil em 2017 e para R$ 54 mil em 2018. É importante ressaltar que a instituição está sob a administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que, assim como as demais instituições de educação federais, sofre com corte de recursos. A situação do Museu Nacional já havia sido denunciada por diversas vezes na imprensa e o Governo Federal havia sido alertado sobre os riscos.
PEC do Fim do Mundo
Tentativas de repasse de recursos para o museu foram frustradas, o que se agravou com a chamada austeridade fiscal, que teve o seu ápice com a aprovação da PEC do Fim do Mundo (PEC 241 e depois 55), em 2016. Ela congelou os investimentos em Educação, Saúde e outras áreas e segue contingenciando cada vez mais os recursos, piorando o financiamento de áreas importantes, como Ciência e Tecnologia, mas não apenas, piorando a situação dessa área e de outras como Saúde, Educação e Cultura.
O Sinasefe Seção Ifes já havia alertado, em 2016, para os efeitos nocivos dessa PEC com uma campanha intensiva explicando as consequências da aprovação de uma medida tão restritiva.
Para o professor de História e mestre em Educação em Ciências e Matemática Carlos Alberto Firmino dos Santos a destruição do acervo e do edifício representa um crime de descaso do poder público que evidencia o distanciamento da sociedade brasileira de sua história, de sua cultura e da produção científica.
“A perda é irreparável. Perdemos 200 anos de história e 20 milhões de peças de valor incalculável para o Brasil e para o mundo. Museu não significa lucro e o que não dá lucro imediato no Brasil é descartado, em uma total incompreensão das potencialidades de um museu, que também é espaço de pesquisa acadêmica, de formação de professores e de potencialidade para a educação da sociedade. O descaso é estrutural e se intensificou muito nos últimos anos, em especial a partir do Governo Temer. A PEC do Fim do Mundo coroa essa lógica retirando recursos de áreas essenciais, como Saúde e Educação, desvalorizando nossa cultura, a arte, e a produção científica, para enriquecer ainda mais o sistema financeiro, os bancos do país’, explicou o professor que também é técnico-administrativo em Educação (TAE) do campus Vila Velha do Ifes e diretor de Formação Política do Sindicato.
Perdas irreparáveis
Boa parte das peças do museu era advinda de coleções selecionadas pelo imperador Dom Pedro II e de presentes de chefes de estado à família imperial brasileira que utilizava o Palácio de São Cristóvão, onde o museu estava instalado, como residência (1822 a 1889), no paço imperial da Quinta do Boa Vista, no Rio de Janeiro. A família real portuguesa também utilizou o prédio como residência (1808 a 1821) e foi lá que a primeira Assembleia Constituinte do Brasil republicano foi instalada entre 1889 e 1891.
As coleções de arqueologia, paleontologia, antropologia e invertebrados que estavam abrigadas no Museu Nacional, assim como laboratórios e salas de aula, foram perdidas, incluindo um acervo de 5 milhões de insetos.
Itens integrados ao acervo ainda na época do império foram perdidos. É o caso dos Afrescos de Pompeia, pinturas presenteadas em meados do século XIX por Dom Fernando II, então rei das duas Cecílias. Havia, ainda, o sarcófago da dama Sha-Amun-Em-Su que viveu entre os séculos IX e VIII antes de Cristo, um presente dado a Dom Pedro II quando ele visitou o Egito, em 1876.
Também queimaram na noite de domingo, 2, a famosa Luzia, o esqueleto humano mais antigo do Brasil, com 12 mil anos; o dinossauro Maxakalisaurus Topai, que viveu há cerca de 80 milhões de anos e media cerca de 13 metros; e a múmia do Atacama, corpo de um homem mumificado encontrado no deserto do Atacama, no Chile, e que viveu há cerca de 4 mil anos.
Havia, ainda, documentos de pesquisas arquivados no local, assim como coleções de Etnologia com objetos que mostravam a riqueza das culturas indígena, afro-brasileira, e do Pacífico; além de uma coleção egípcia e uma sala com ossadas de dinossauros, assim como outros inúmeros itens, a maior parte deles não expostos.