Fala, Base! “Você me conhece?”
Data: 20 de abril de 2021
Em novo material do Fala, Base, professor do Ifes escreve poema sobre o Dia da Resistência Indígena (19 de abril)
Ivan Almeida Rozario Júnior
Docente e Presidente do Fórum dos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas do Ifes
VOCÊ ME CONHECE?
Sou constituído pela seiva bruta das matas.
O meu sangue escorre como nascente de onde brota a vida.
Sou a semente que germina na terra, produzindo o alimento que sustenta os meus pés descalços.
Caminho por territórios demarcados, porém marcados pelo sangue derramado de meus parentes devido à estratificação das riquezas naturais pelas mãos do mercado.
Você me conhece?
Eu venho de longe.
Sigo os passos de meus ancestrais.
Eu sou autóctone, sou originário.
Nasci antes do Brasil – nome dado pelos invasores a este grande espaço continental.
Sou o barro e, assim como ele, deixo-me modelar pelas mãos do grande oleiro… Tupã.
Você me conhece?
Sou a floresta, oxigenando-me na resistência do existir.
Sou o rio que, nascido no recôndito das pedreiras, deleita-se rumo ao mar.
Sou o peixe, sou o pássaro, sou a onça, sou o urso, sou a águia, sou a serpente.
Sou a energia, sou a força e o poder dos animais em ritual xamânico.
Você me conhece?
Chamaram-me “índio”, equivocadamente representado pelo olhar do colonizador.
Este mesmo colonizador que, tomado pela cegueira do desbravamento, acabou se perdendo na ganância de ter e do poder.
Você me conhece?
Se ainda não, aprenda a observar a natureza.
Eu sou ela, e ela sou eu.
Sou filho da Terra Mãe, a quem devo toda a minha força vital de caminhar adiante.
Você me conhece?
Sou Guajajara, sou Kaiowá, sou Tupiniquim, sou Krenak.
Sou Munduruku, sou Potiguara, sou Guarani, sou Terena.
Somos entre muitos, somos mais de 300 etnias. Somo plurais, somos singulares, somos diversos.
Não nascemos e nunca fomos selvagens.
Vivemos na Terra, lugar das relações sociais, espaço potência para conviver.
Aprendi com os meus ancestrais desde sempre a viver na companhia do outro.
Você me conhece?
Se ainda não, arranque a venda tecida pelas crenças eurocêntricas.
Desmitifique o seu olhar obtuso, limitado pelas lentes da colonização.
Expanda a sua consciência e seja bem-vinde a minha grande roda.
Na circularidade do existir-sendo, vamos aprendendo a enxergar.
Vamos juntes construindo novas pontes de afeto e fraternidade.
Na liberdade dos corpos, na liberdade dos pensamentos.
Rumo à construção coletiva de um novo marco civilizatório.
Você me conhece?
Muito prazer, EU SOU INDÍGENA!
*Este texto faz parte do projeto “Fala, Base!” e não reflete, necessariamente, a opinião do Sinasefe Ifes. O material é de inteira responsabilidade do autor.