PEC 241: “Reverter esses retrocessos dependeria de uma mudança profunda na política nacional”
Data: 5 de agosto de 2016
Em entrevista ao jornal EnCAMPI, Elenira Oliveira Vilela, professora do Ifsc, avisa que o Congresso deve aprovar medidas contra os trabalhadores e defende ações de vulto para tirar população da apatia
A professora do Instituto Federal de Santa Catarina e diretora da Seção Ifsc Elenira Oliveira Vilela será trazida à Vitória pela Seção Ifes para debater a bomba mais recente contra os serviços públicos e os brasileiros mais pobres que é a PEC 241/16, em tramitação na Câmara dos Deputados, já aprovada na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ). Ela fala sobre o assunto na próxima quinta-feira, 11, às 14 horas, na sede da Adufes, no campus de Goiabeiras da Ufes, durante o seminário “Ataques Contra os Serviços Públicos”.
A PEC, apelidada de “PEC do Fim do Mundo”, pode devastar o SUS, as universidades públicas e a Previdência. Ela prevê o congelamento de gastos públicos por 20 anos, em especial na Educação e na Saúde.
Confira!
Site Sinasefe Seção Ifes – Sabemos que a PEC 241 pretende congelar por 20 anos os salários dos servidores públicos e os investimentos em Educação e Saúde. Quais as chances desta medida ser aprovada neste cenário? O que, realmente, se pretende com essa PEC?
Elenira Oliveira Vilela – Infelizmente as chances são muito grandes. O Congresso está dominado pelos golpistas e para a aprovação da PEC são necessário menos votos (308) do que os 367 dados para o golpe na democracia. A mídia golpista faz sua parte nesse processo, encaminhando uma campanha de chantagem nacional, afirmando que sem essas medidas será necessário aumentar impostos e a economia do país, incluindo os empregos, estaria em risco. A realidade é exatamente o oposto disso, mas não seria a primeira vez que os interesses do sistema financeiro e de grandes corporações, apoiados pelos conglomerados de mídia, promovem campanhas contra o interesse nacional, em nome do interesse nacional. Lembrando que no dia 29 de julho a PEC já teve sua admissibilidade aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
Por que não vemos uma reação da população e dos próprios servidores e dos trabalhadores, como vemos na Europa? O que faz com que as pessoas não se levantem para lutar congtra medidas que prejudicarão não apenas a coletividade, mas a vida privada de cada um?
O Brasil é um país com uma democracia jovem, com uma história de dominação profunda e de repressão violenta a todos e todas que se rebelam. Por isso, os movimentos de luta contra a exploração e retirada de direitos conseguiram ganhar vulto e serem massivos em poucos momentos da história. Acrescente-se a isso uma mudança tática das maiores organizações de trabalhadores, como o PT e a CUT, que apostaram todas as suas fichas nas conquistas por meios eleitorais e pouco ou nada na mobilização e no aumento da consciência de classe. O trabalho de formação política partidária cotidiana feito pelas famílias donas dos maiores e mais autoritários conglomerados midiáticos do mundo, especialmente nas TV’s abertas, também é uma barreira difícil de romper.
Temos que chegar em todos os corações e mentes, mostrar o que está por vir. Temos que organizar ações tradicionais, como assembleias e formações. Mas também precisamos fazer ações de alto impacto, que possam realmente chamar a atenção para o que está acontecendo e o significado da entrega do nosso país e o desmonte do Estado. A direita está sendo radical, destruindo nossos direitos e a democracia na sua raiz. Também precisamos ser radicais.
Estamos assistindo a uma avalanche de PL’s, PEC’s e medidas do interino Temer que desmontam o pouco de estado de bem estar social que o Brasil construiu. Vamos assistir a um retrocesso irreversível nos avanços, mesmo que insuficientes, da Constituição de 88, das políticas inclusivas e de toda e qualquer política mais progressiva em andamento?
A história é viva e nela nada é para sempre. Mas sem dúvida é possível dizer que o legado da luta contra a ditadura, do novo sindicalismo e por direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, indígenas, contra o racismo e a homofobia — tudo isso que é sintetizado na Constituição de 1988 e inclusive legados anteriores, como a soberania nacional e os direitos mínimos — estão em grande risco. E reverter esses retrocessos dependeria de uma mudança profunda na política nacional, o que não está no horizonte se pensarmos no nosso grau de organização para nos contrapormos a essa onda e no funcionamento da política formal no Brasil.
No meio disso tudo você vê espaço para uma luta por avanços ou é hora de tentar reduzir os danos que estão por vir?
A principal luta é para evitar os retrocessos, sem dúvida. Já é lugar comum repetir que a crise é sempre um momento de perigo e oportunidade. Penso que esse processo descortina o quanto temos trabalhado e o quanto da nossa riqueza tem simplesmente sido transferida para o sistema financeiro e essa transferência acontece justificada pela tal dívida pública. Sabemos que sem uma auditoria jamais teremos a certeza do quanto realmente devemos e, principalmente, sabemos também que não foi o povo que se beneficiou dessa dívida. Se conseguirmos voltar a denunciar e combater o sistema da dívida, teremos tido um grande avanço. Um bom paradigma é o caso das propostas que atacam os direitos das mulheres, o movimento feminista conseguiu reagir e sair da sombra, abriu o verbo e defendeu a descriminalização do aborto, o debate avançou. Temos que fazer isso com essa reedição do neoliberalismo no Brasil e com o golpe. Temos que transformar isso num avanço do movimento contra o sistema da dívida e não admitir mais nossa riqueza sendo entregue para banqueiros.